Entre o ideal e a realidade: ensino superior angolano enfrenta custos crescentes apesar do apelo à acessibilidade

Apesar do discurso oficial sobre inclusão do Ministério, propinas elevadas, fraca investigação e graves desigualdades continuam a limitar o acesso ao ensino superior em Angola

Durante a cerimónia de abertura do ano académico 2025/2026, realizada a 3 de Outubro, o Ministro do Ensino Superior, Ciência, Tecnologia e Inovação, Albano Vicente Lopes Ferreira, reafirmou que o ensino superior angolano “deve ser socialmente acessível, útil e pertinente para responder à crescente demanda dos jovens” que aspiram à formação universitária e à inserção no mercado de trabalho. 

O apelo, contudo, surge num contexto em que as propinas nas instituições de ensino superior (públicas e privadas) voltaram a subir, contrariando o princípio de acessibilidade defendido pelo titular da pasta. Nos últimos três anos, universidades e institutos politécnicos registaram aumentos acumulados que variam entre 15% e 40%, consoante o curso e o regime, agravados pela inflação e pela ausência de políticas de contenção de custos no sector.

Custo da formação e a desigualdade que Albano quer combater

Em Luanda, o valor médio de uma propina universitária ronda actualmente os 45 mil kwanzas nas universidades privadas regulares e pode ultrapassar os 200 mil kwanzas nas de referência, isso, claro, sem incluir taxas de matrícula, exames e outros encargos administrativos. Em algumas províncias do país, onde as empresas não recebem qualquer alívio fiscal do Estado, as instituições dependem quase exclusivamente das propinas para financiar o funcionamento, o que as leva a actualizar os valores anualmente.

Para estudantes de famílias com rendimentos médios, o custo de uma licenciatura de quatro anos ultrapassa facilmente 1,5 milhão de kwanzas, excluindo transporte e material didáctico. O cenário coloca o ensino superior fora do alcance de milhares de jovens, sobretudo em regiões do interior, onde as alternativas públicas são escassas e as bolsas de estudo internas não cobrem a procura.

Segundo dados recentes do INAGBE, foram atribuídas 10.500 bolsas internas para o presente ano académico, número considerado insuficiente face ao universo de mais de 300 mil estudantes matriculados. A disparidade entre o discurso de inclusão e a realidade económica acentua as desigualdades regionais e sociais no acesso à formação.

Infra-estruturas frágeis e desafios de qualidade

Além da questão financeira, especialistas apontam outros problemas estruturais persistentes como insuficiência de docentes em regime de tempo integral, laboratórios desactualizados e falta de financiamento à investigação científica. O relatório mais recente do INAAREES revelou que mais de 60% dos cursos avaliados no país obtiveram classificações “satisfatórias com reservas”, o que evidencia a distância entre a expansão numérica do sistema e a sua qualidade efectiva.

Embora o ministro Albano Ferreira tenha sublinhado a importância da “pertinência social do ensino superior” e o compromisso do governo com a “melhoria da empregabilidade e da produção científica”, a realidade institucional mostra que o ensino superior angolano continua a ser oneroso, desigual e insuficientemente articulado com o mercado de trabalho.

Um sistema em busca de equilíbrio

Para analistas da educação, o discurso ministerial reflecte um ideal necessário, mas o desafio é traduzi-lo em políticas concretas como melhoria dos preços, aumento de bolsas, apoio à investigação e expansão de cursos públicos em áreas carenciadas.

Enquanto isso, estudantes e famílias continuam a ajustar orçamentos e expectativas. Nas palavras de um finalista ouvido pelo Jornal Académico: “O ensino é o caminho para um futuro melhor, mas a cada ano o custo aumenta e o sonho parece ficar mais caro.”

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